sexta-feira, 22 de abril de 2016

Poema: Historiador - Carlos Drummond de Andrade





Veio para ressuscitar o tempo 
e escalpelar os mortos, 
as condecorações, as liturgias, as espadas, 
o espectro das fazendas submergidas, 
o muro de pedra entre membros da família, 
o ardido queixume das solteironas, 
os negócios de trapaça, as ilusões jamais confirmadas 
nem desfeitas. 

Veio para contar 
o que não faz jus a ser glorificado 
e se deposita, grânulo, 
no poço vazio da memória. 
É importuno, 
sabe-se importuno e insiste, 
rancoroso, fiel. 

Carlos Drummond de Andrade, in 'A Paixão Medida'